sábado, 6 de novembro de 2010

Autonomia versus supervisão na RM

Recentemente houve uma greve nacional de médicos residentes. Exigiam aumento “salarial”. Diferente do que pude perceber em outras greves, algumas das quais participei ativamente, não houve cobranças por melhorias locais nos Programas de Residência Médica (PRM’s).

Não há o que melhorar na estrutura e no ensino dos PRM’s Brasil afora? Há treinamento sob supervisão adequada em todos eles?

Observo que a pouca motivação, que eu já percebo há mais tempo na maioria dos médicos com mais de 10 anos de formados, nos últimos tempos vem tomando conta dos mais jovens também, iniciando já no período da RM. Exemplo disto talvez seja o que aconteceu em feriadão ao longo deste ano. Preciso deixar registrado que não me sinto imune a este fenômeno, muito pelo contrário.

Fui ao hospital em uma segunda-feira, sendo que terça-feira era feriado, e liguei para o residente: “Vamos discutir os pacientes?”. “Ainda não avaliei todos, mas acho que está tudo mais ou menos estável, não sendo necessário então”, disse ele. Trata-se de um excelente residente de primeiro ano de Clínica Médica. Mas, independente disto, minha questão é: residentes devem atender pacientes sem nenhuma supervisão nos finais de semana e feriados? Isto costuma ser a regra no meu serviço. No caso em questão, os pacientes ficariam desta maneira, sob inteira responsabilidade do residente, de sábado (inclusive) até quarta-feira? Considerando a possibilidade de que o round na sexta-feira fosse realizado pela manhã e na quarta somente à tarde, seriam mais de 120hs sob “treinamento sem supervisão".

Alguns defendem essa independência como a necessidade de permitir “que aprendam com seus erros” e afiem seus instintos clínicos. Entretanto, se é verdade que as profissões devem propiciar aos aprendizes oportunidades para “praticar” seu ofício, erros em outras áreas têm, em geral, menores conseqüências. E sabemos que muito disto na Medicina é conseqüência de imperativos econômicos: as demandas da prática médica têm levado ao uso de profissionais em treinamento como força de trabalho mais barata. Preceptores não costumam ser bem valorizados/remunerados e, muito freqüentemente, não fazemos desta atividade uma prioridade.

Mas qual seria o balanço ideal entre autonomia e supervisão?

Tradicionalmente, preceptores se desviam para o lado da autonomia, entendendo que os principiantes devem aprender fazendo – originando o icônico mantra do treinamento médico “veja um, faça um, ensine um”.

No outro extremo, o moderno movimento de segurança do paciente reconhece que “aprender com os erros” é algo fundamentalmente antiético se está impregnado no sistema, e que não é razoável assumir que profissionais em treinamento irão saber sempre quando precisam de ajuda.

Dirigido em grande parte por esse movimento de segurança do paciente, um equilíbrio, nos EUA, vem pendendo ultimamente para o lado da supervisão, embora não haja uma fórmula mágica para responder ao dilema.

Naquela segunda-feira, respondi que esperaria em uma sala e ficaria a disposição caso fosse preciso. Não foi!

E enquanto em muitas equipes costumam fazer feriadão... trabalhos sugerem que finais de semana comuns já seriam suficientes:

Analysis of the mortality of patients admitted to internal medicine wards over the weekend. Am J Med Qual. 2010 Jul-Aug;25(4):312-8. 

The management of patients admitted during weekends may be compromised because the level of staffing in the hospital is often lower then. This study was conducted to assess what independent influence, if any, weekend admission might have on inhospital mortality. The authors analyzed the clinical data of 429,880 adults >14 years of age who were admitted to internal medicine wards in Spain after having presented to the hospitals' emergency departments. Overall mortality and early mortality (occurring in the first 48 hours) were examined, taking into account whether a patient was admitted on a weekend or a weekday, in addition to other parameters. Weekend admissions were associated with a significantly higher inhospital mortality than weekday admissions among patients admitted to an internal medicine service (odds ratio [OR] = 1.1; 95% confidence interval [CI] = 1.14-1.08). Differences in mortality persisted after adjustment for age, sex, and coexisting disorders (OR = 1.071; 95% CI = 1.046-1.097). Analyses of deaths within 2 days after admission showed larger relative differences in mortality between weekend and weekday admissions (OR = 1.28; 95% CI = 1.22-1.33). For patients admitted to an internal medicine service via an acute care visit to the emergency room, admission on weekends is associated with higher mortality than admission during the week. 

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