quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Melhoria de processos tem muito de "simples" vontade...

... e a ausência disto por corroer cultura institucional e deixar cicatrizes por longo prazo!

Neste contexto, lembro de recente tentativa em um hospital de otimizar o processo entre prescrição de sonda nasoentérica e administração de dieta.

Interessante seria fazer isto desonerando o médico - um profissional tão caro - de atribuições das quais pudesse ser substituído, preferencialmente automatizando o processo, eventualmente terceirizando a ação para outro profissional.

Aprendi isto com o engenheiro de produção carioca Felipe Espindola Treistman, quando trouxe, a meu convite, a seguinte provocação aos participantes do Safety2014: "Podemos aprender algo com os hospitais indianos?”"

Tendo realizado uma missão técnica na Índia, apresentou informações e dados muito interessantes:

– O grupo Aravind realiza sozinho, em um ano, mais do que a metade de todas as cirurgias oftalmológicas realizadas no sistema inglês. A um custo muitíssimo menor do que no NHS.

– Nada disto seria importante se houvesse mais eventos adversos. No entanto, os resultados lá são melhores também neste quesito.

Quais foram algumas características observadas por Felipe dos hospitais indianos de referência visitados?

– Possuem processos altamente padronizados;

– Todos os profissionais (inclusive médicos) atuam em dedicação exclusiva;

– O trabalho do médico é focado nas tarefas mais complexas ou que agregam mais valor, em paralelo ao aumento da participação de enfermeiros, técnicos e outros profissionais (escrevi recentemente mais sobre isto em O Ato Médico e os hospitalistas);

– Distribuição dos profissionais baseada em previsão confiável da demanda e, portanto, variável;

– Há flexibilidade de alocação dos médicos (imaginemos um serviço de emergência como o brasileiro: em nome da eficiência, não houvesse pacientes no setor de graves, o médico ali posicionado passaria a atender “nos consultórios, colaborando para o encurtamento das filas e otimização dos tempos);

– Executam intensa análise de indicadores de produtividade e qualidade.

Mas, voltando a questão da tentativa em um hospital de otimizar o processo entre prescrição de sonda nasoentérica e administração de dieta, esbarrei não foi em necessidade de tecnologia de alto custo, ou grande complexidade da proposta. Esbarrei essencialmente em vontade da média gestão e falta de apoio da alta. Em argumentos não acompanhados de dados mensurados - meras opiniões, portanto -, tais como: "irá aumentar tempo de jejum" ou "radiologia não irá conseguir".

Simplesmente discutir o assunto era visto como gerador de calor, imaginem o que foi tentar provocar as mudanças.

Recentemente estive na Capital Federal convidado pela gestão do Hospital Brasília para direcionar tempo de hospitalistas para atividades de maior valor. O que seria maior valor? Evitar o esquematizado abaixo:


Traduz idas e vindas, e, principalmente, grande desperdício de tempo e muita dependência do médico.

Aí vem o HCPA, através principalmente do grupo da CCIH, dentro de protocolo multimodal para atacar desnutrição como contribuinte para pneumonias nosocomiais não associadas à VM, e, com muito pouco trabalho e calor, sai do contexto ilustrado acima para outro com processos mais compactos e enorme redução de jejum.


Entre outras ações, fizeram funcionar uma solicitação automática do RX de posição concomitante à prescrição da sonda, obtiveram agilidade da radiologia para emissão dos laudos, instrumento usado pela enfermagem para liberação das dietas, garantindo ainda a ocorrência disto imediatamente após um registro no sistema, potencial importante ferramenta de gestão de risco jurídico também.

É possível então! Mas simples vontade é algo distante de simples.

Sobre uma recente experiência em Brasília

ARTIGO RELACIONADO AO CLICAR NA IMAGEM

domingo, 13 de novembro de 2016

#JaneiroBranco

Um mês para mente livre de doenças, para pensar no hoje e, no máximo, planejar a vida com base no que há de concreto em nossas vidas:


quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Segurança do Paciente: teoria versus prática

Teoria:


Prática (relato mantendo profissional notificador, hospital e pacientes em anonimato):

'Em meu hospital, certo dia eu cometi um erro, e notifiquei os responsáveis através de e-mail e mensagem abaixo:

"Hoje cometi um erro de dose. Como nem através do sistema, nem lendo diretamente o rótulo na ampola, consegue-se identificar prontamente quantas gramas por ml têm os sulfatos de magnésio disponíveis, e eu estava correndo para fazer uma simples regra de 3 (não sei se precisava, mas enfim...), errei e prescrevi dose excessiva. Mas muito induzido também por um push padrão que o sistema oferece, que está ainda com tempo de infusão inadequado".

A partir disto, sugeri melhorias, como acréscimo da informação gramas por ml ao prescritor (já que nos manuais encontra-se mais comumente a dose de Mg em gramas) e ajuste do push padrão, criando duas alternativas inclusive (uma para reposição de Mg especificamente, lenta. Outra com 2g de sulfato de magnésio em 20 minutos, tratamento de segunda linha para asma aguda grave).

As respostas que recebi oficialmente foram reclamando de minha postura, ou dando informações que não interessavam, como quem informou o push padrão errado. Supervisor assistencial de sistemas escreveu ainda:

"De qualquer forma, vale sempre lembrar que a tela de rotina é apenas uma máscara para facilitar, podendo a qualquer momento o prescritor alterar os dados da solução clicando em detalhe e ajustando". Leia-se: burro incompetente, se havia um erro, cometestes outro em cima.

Esta foi minha resposta, depois disto nunca mais notifiquei na instituição:

"Pessoal, olha só, muito abertamente:
Um sistema que busque melhorias pelo apontamentos de equívocos somente sobrevive se brincarmos com os erros, se acharmos graça do erro do outro e do próprio erro, claro que sem perder o foco do porquê estamos nesta.
Tenho estado cada vez mais retraído para apontar coisas na casa...
Se interessa ao grupo, esta semana errei pra caramba, são pacientes ainda hospitalizados, então as provas estão todas lá.
Do seu xxxxxx não vi um resultado de cultura. Por sorte, quando visto, 48hrs depois da liberação, a conduta não necessitava alteração. Mas, fosse diferente, a história poderia ter sido diferente (já sugeri algumas vezes uma forma de melhor sinalizar isto para os médicos assistentes).
Já com xxxxxx foi pior. Suspeitei de trombose na perna (achando baixa a probabilidade, é verdade) e não só não deixei o pedido do exame que registrei intenção de pedir, como não deixei sequer heparina profilática (não havia, e não acrescentei, achando que havia). Outro colega encontrou dois dias depois clínica altamente sugestiva (entrou um colega em meu lugar no final de semana) e ecografia feita com atraso no domingo confirmou TVP. A paciente seguia sem profilaxia, iniciou diretamente anticoagulação plena."

Como resolver ou mitigar estas questões?'

O desafio real não é saber o que deve ser feito, mas driblar as armadilhas da vida que nos afastam disto. Muito mais amplo e desafiador. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Dangers of the Digital Age in Medicine

Erros associados aos cuidados em saúde: um caso verdadeiro.

Recebi este relato:

"Caro Guilherme, escrevo para descrever situação, considerando que possa explorá-la em seu Blog, e que desdobramentos e discussões tragam ao menos insights úteis para o movimento de segurança do paciente. Agradeço a preservação da identidade dos todos os envolvidos.

Sou médico de meia-idade, modéstia a parte muito bem sucedido, e atuo em renomadas instituições de capital, muito comumente envolvido com casos clínicos complexos ou pacientes graves.

Atendi recentemente idoso em enfermaria, um suposto caso de asma exacerbada. Descrição de que chegou bastante mal. Já o conheci provavelmente melhor, depois do manejo no PS, ao comparar com registros e relatos. Ainda chiava bastante. Na minha segunda visita, estava, comparado ao dia anterior, definitivamente melhor, chiando muito menos, mantinha ausculta pulmonar simétrica bilateral. Sai do quarto e registrava o atendimento no computador junto ao posto de enfermagem quando chamaram por parada cardiorrespiratória - em meu paciente. Fui correndo até o quarto, chegando junto do médico intercorrentista. Ele, sabendo de minha condição de assistente principal, colocou-se inicialmente em posição de retaguarda. Mas percebeu minha demora em atuar, e chamou para si a liderança do atendimento: iniciou massagem e passou a delegar as primeiras ações, enquanto aguardávamos o time de parada cardiorrespiratória.

Reflexão #1: Sou um médico bem experimentado neste tipo de atendimento, mas bem verdade que fazia algum tempo sem atuação prática ou treinamento em ressuscitação cardiorrespiratória. Avaliando retrospectivamente, percebo claramente que, surpreendido e surpreso com a evolução apresentada pela paciente, perdi momentaneamente o foco necessário – estava com os pensamentos mais voltados para o que levou o idoso a colapsar daquela forma. Foi quando o colega resolveu, assertivamente, assumir o controle da situação. A primeira falha foi minha!

Logo depois chegou o time da parada cardiorrespiratória. Todos vestidos iguais, aventais verdes de área fechada. Ninguém se apresentou. Um rapaz bateu no ombro do médico intercorrentista que estava a massagear e disse com muita propriedade: - “deixa conosco”. Reforçou algumas ordens e questionamentos, como “monitorar”, “acesso venoso?”. Eu e o plantonista do andar colocamo-nos como observadores do atendimento, eu convencido que o rapaz era o médico da equipe. Pouco tempo depois chegaram outros dois de verde, mas nada falaram. Um deles dirigiu-se à cabeceira para manejo de via área, interpretei que era um segundo médico. O rapaz que bateu no ombro do colega era um (muito bom) técnico de enfermagem. Naquele time, todos correram para o ambiente da grave intercorrência, menos os médicos, que, caminhando, chegaram depois.

Presenciei coisas diferentes das previstas em manuais internacionais de boas práticas. Demorou-se para avaliar o ritmo da parada, houve dificuldades na intubação por questões técnicas, não vi checarem se o tubo estava no lugar certo a partir da tradicional ausculta epigástrica e dos quatro campos pulmonares. Definitivamente não havia papéis e funções claramente definidos.

O paciente teve a parada revertida e foi encaminhada à UTI.

Reflexão #2: Façamos uma analogia entre o atendimento de uma parada cardíaca e o Pit stop de corrida automobilística. No Pit stop, não basta o abastecimento e a troca de pneus. Se tudo não ocorrer em menos de minuto e seguindo um alto padrão de qualidade, de nada adianta, ao final, o tanque cheio e os pneus novos. Pois então...
Será que na Saúde não estamos aceitando coleção de falhas, como se em nosso Pit stop não importasse o tempo ou a eficiência? Eu próprio já participei como líder maior em atendimentos que não transcorreram idealmente, mas quando o paciente é “salvo” (tem pulso! saiu da parada!) eximimos-nos de pensar mais amplo, por diversas razões... Guilherme, se esperarem de cada um de nós a auto-crítica e a ação relacionada, não acontecerá, nada acontecerá. É até compreensível, entendes?

Fui lá na UTI algum tempo depois, na expectativa de passar melhor o caso, uma das minhas hipóteses diagnósticas (embolia pulmonar) e sugestão de avaliação diagnóstica: - “gostaria, assim que estabilizado, e se possível, que o encaminhássemos para uma angiotomografia”. Era início da noite e fiquei com a nítida impressão de que os colegas queriam fazer as coisas o mais rápido possível. Outra sensação era de que eu estava atrapalhando, ou pelo menos sobrando. Cheguei a perguntar se queriam que eu assumisse daquele momento em diante. Acho que também não me apresentei como médico assistente (a gente sempre pensa que é óbvio, não?). Posso ter sido confundido com o intercorrentista do andar. A resposta foi: - “quem sabe senta no computador e deixa descrito o que gostaria de dizer”. Retraí-me. Muito fortemente.

Reflexão #3: Terei errado novamente, Guilherme? Não gostaria que fosse verdade, já bastante incomodado com a primeira falha. Mas saiba que não era um momento onde conversar seria inadequado. O paciente já estava em ventilador mecânico, harmônico, saturando bem, com pressão arterial e frequência cardíaca adequadas. Eu definitivamente não representava um sem noção atrapalhando em uma situação com necessidade de foco total.
A própria interpretação de que estavam “com pressa” pode vir influenciada por minha contra-referência. Mas, enfim, como estas coisas podem ser melhoradas? Há uma estranha cultura tomando da Saúde onde existe cada vez menos diálogo e parceria. Isto se aprende em treinamentos de equipe? Imagino que não...

O que vi no seguimento foi ainda pior. Passagem de acesso venoso central com quebras grosseiras de barreiras de proteção (lavagem de mão, paramentação completa) e, reforço, numa situação já sob controle, onde não haveria justificativa. A Enfermagem ofereceu o aparelho de ecografia, que sabemos aumenta a segurança do procedimento. Não foi utilizado.

Se havia foco necessário o suficiente para não se permitir conversas paralelas, como explicar a liberação do paciente para angiotomografia logo em seguida? Sabemos que transporte intra-hospitalar é um momento de muitas vulnerabilidades e riscos. Normalmente, algumas coisas são sempre feitas antes, por mais compensado que pareça o paciente, como avaliação de uma gasometria arterial, para ver se a ventilação mecânica está mesmo adequada, e de um simples RX de toráx.

Radiologista ligou para a UTI avisando: ausência de embolia. Presença de pneumotórax bilateral!!! Diagnóstico que poderia e deveria ter sido feito a partir do RX, sem o paciente sair da unidade intensiva. E o tratamento disto - drenagem de tórax - obrigatoriamente imposto antes de qualquer transporte.

A paciente foi salva. Desenvolveu estado vegetativo persistente.


Tenho lido muito que, consciente ou inconscientemente, ao absorvermos, calados estes eventos cotidianos, nós, profissionais da saúde, estamos na verdade nos boicotando, além do sistema. Nunca o esgotamento profissional esteve tão prevalente, em parte por estes fatores, e criando ciclo vicioso de mais falhas na assistência à saúde. Eu agendei meu Curso de Suporte Avançado de Vida em Cardiologia–ACLS para o próximo mês". 

Por que protocolos pouco funcionam? Por que médicos não aderem aos guidelines?


Pelas inúmeras questões que permitem as críticas aos guidelines apontadas e consequentes justificativas dos médicos para não aplicação (parte delas adequadas até), reforço minha ideia de que devem ser incorporados muito lentamente para sucesso. 'Slow' para dar tempo de serem construídos ou adaptados bottom-up, acoplados a iniciativas mais amplas de melhoria da qualidade. Isoladamente, guidelines ou protocolos, pouco funcionam.

Como exemplo, lembro de iniciativa recente em hospital onde corrida por protocolos deflagrada pela Acreditação fez com que um serviço gerasse cerca de duas dezenas deles em poucos meses. Chegaram a gerar um livro. Nada discutido com a ponta, composta inclusive por diversos profissionais de outras especialidades. Conflitos inúteis (mas por vezes compreensíveis e até legítimos) a cerca de quem é dono do que na Medicina, pela natureza absolutamente transdisciplinar de alguns temas, entre outras complexas razões, apenas ilustram motivos para, não infrequentemente, protocolos servirem para fazermos justamente ao contrário do que neles constam.

A relação de protocolos locais e governança clínica é outro assunto instigante. Em outro hospital, observei situação interessantíssima: médico nada aderente a padronizações e protocolos locais, mas puxa-saco da gestão (é muito comum preferirem o perfil que não questiona), foi promovido à coordenador assistencial. Seguiu nada aderente ele próprio, não preenche uma ficha, mas passou a cobrar aderência de terceiros. Destes terceiros, escutei com todas as letras que "agora sim largariam de mão". As duplas mensagens dentro das organizações são um enorme problema, capazes de corroer culturas, e de causar cicatrizes definitivas e que comprometem processo de melhoria de forma dramática. Responsabilidade da alta gestão. Não de guidelines ou protocolos em si.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Para mudar, é preciso fazer diferente!

Depois de 3 anos, espero que momentaneamente, deixei de ser hospitalista mais uma vez. Descrevo apenas porque acredito seja importante para sustentabilidade do modelo.

Não encontrei a valorização esperada depois de gerar resultados muito positivos. Com uma mudança de postura do hospital, passei a ser também um coordenador de grupo não ideal, na visão da organização: onde já se viu dizer que entendo hospitalistas não quererem assumir determinadas funções e ainda lutar pelo interesse deles? Negociamos minha saída.

Eu faria muita coisa na vida, até mesmo atuaria exclusivamente na gestão de qualidade e segurança (apesar de acreditar fortemente que o principal para gerar resultados neste campo dependente de profissionais da linha de frente também bons em qualidade e segurança; e apesar de ter clareza de que o que mais gosto de fazer é ver pacientes). Mas duas coisa eu não quero mais na vida há algum tempo e tentarei não mais fazer: Time de Resposta Rápida (TRR) nos moldes da maioria dos hospitais privados, medicina intensiva nos moldes das UTI's da maioria dos hospitais privados brasileiros.

Hospitais reclamam de falta de engajamento, mas vejam só: migrei de uma função onde havia compromisso diário e sobrecarga de finais de semana, para outra onde mantenho plantões em instituição com UTI que valoriza fortemente o intensivista (a ponto de ter 100% de intensivistas "puro sangue" no quadro funcional e uma rotina prestigiada) e um TRR show de trabalhar. Acrescentei novamente horas na qualidade/segurança (gabinete). Passei a ganhar muito pouco a menos. E hoje estava correndo na orla do Guaíba às 11hrs da manhã. Tenho condições de ajustes nas semanas para liberar períodos ou dias, e, em função disto, na semana que vem estarei estendendo estada em Salvador por evento, e curtirei dois dias de Praia da Barra, com vista para a Baía de Todos os Santos.


Meus caros, para terem os médicos que sonham, hospitais precisaram fazer diferente. Senão, é e será o platonismo que tanto critico, para mim inclusive!

Deixem hospitalistas, emergencistas e intensivistas serem médicos!

Qualquer modelo necessitará de tapa furos, pensar diferente é utopia. E esta função serve sim para alguns profissionais. E mesmo que interessasse para muitos, pelo bem do sistema, deve ser limitada.

Deve-se fortalecer ao máximo a continuidade na tomada de decisões. A intensidade da disponibilidade in loco deste tomador de decisões deve respeitar menos conveniências do médico, e mais necessidades dos pacientes.

E UTI aberta ou fechada é bobagem, superemos isto. Que intensivistas sejam protagonistas do cuidado intensivo! Mas que não representem UTI's onde outros médicos do paciente e familiares não tenham voz. Chega de dicotomia burra: foco no paciente.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Que tu estavas fazendo lá, eras o único chinelo da mesa?

 Foi assim que um amigo me recebeu depois de minha participação como painelista no Simpósio de Liderança Clínica / HIS2016: "Que tu estavas fazendo lá, eras o único chinelo da mesa?"

Tudo brincadeira, para o início de um papo descontraído. Mas com um fundo de verdade que me deixa orgulhoso.

O Hospital Innovation Show é o principal trade show de inovação focado no mercado de saúde na América Latina, e realmente eu era um dos poucos ali que não tinham uma grande empresa por trás, no mínimo uma startup promissora. Somente um emprego comum de médico, a recém formada ABMH e ideias, muitas ideias...


Adicionar legenda



A maioria na minha volta era, pelo menos, diretor geral de hospital. Hoje nem hospitalista e coordenador de grupo sou mais: meu hospital desistiu das minhas ideias e eu desisti deles.

Certamente uma grande empresa por trás facilita para lá estar: por trás da iniciativa há uma legítima perspectiva de reunir grandes players do mercado. Fiquei orgulhoso de ser tratado como importante player, mas mercado não é palavra que mereça acompanhar minha designação não. Não me orgulho disto, mas, tentando ver as coisas pelo lado positivo: adorei ser reconhecido por IDEIAS.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Gestão de Corpo Clínico: entre conceitos ultrapassados, novas realidades e hospitalistas

Esta é uma postagem de 2014 em Saúde Business, referente a uma palestra que dei e o evento em questão. A versão original foi corrompida em mudança de plataforma. Ainda está bastante atual...




Participei em recente evento de Gestão do Corpo Clínico, em São Paulo, entre maioria de palestrantes e participantes representantes do nível estratégico ou do alto nível tático de organizações hospitalares brasileiras. O painel foi sobre corpo clínico aberto versus corpo clínico fechado, e fiquei com a impressão, a partir de conversas preliminares, de que, pela minha identificação com hospitalistas, muitos esperavam defesa contundente ou exclusiva de corpo clínico fechado. E que boa parte destes esperava que eu fosse propor isto na forma de Revolução, substituindo o “velho” pelo “novo”, onde todo hospital privado virasse integralmente de equipes contratadas (em parte pelo mito do hospitalista como obrigatoriamente empregado do hospital) e com generalistas não subjugados ao poder de terceiros (mito da autonomia médica como variável indivisível).

Para começar deliberadamente confundindo, apresentei dados de 2011 Today’s Hospitalist Compensation & Career Survey: Mais da metade dos hospitalistas nos EUA não são empregados dos hospitais! Muitos ainda não compreendem além de superficialmente o modelo, e que as possibilidades de contratos, vínculos e formas de remuneração dos profissionais podem variar bastante. Interessa mesmo onde se quer chegar.

A partir disto, posicionei-me dizendo que as definições clássicas de corpo clínico aberto e fechado, da década de 70, já não dão conta da complexidade e do dinamismo da prática hospitalar moderna. Além disto, são pouco centradas no paciente e, muito frequentemente, servem apenas para fomentar exercícios de poder improdutivos*.

tanto exercícios de poder do tipo “"aqui neste pedaço mando eu e mais ninguém”", como o contrário. Estive em hospital recentemente cujo grupo da Emergência justificou lacunas em etapas do cuidado e/ou de registros em prontuário com o argumento de que o paciente era do médico x ou y, representante de corpo clínico aberto. Quando questionei, rebateram com a importância da coordenação do cuidado por uma única pessoa e da continuidade não apenas do cuidado, mas das e nas equipes, dizendo que eu próprio defendia isto (leia aqui e aqui). Ocorre que, na vida real, 100% de continuidade pela mesma pessoa é meta intangível, não podendo servir de justificativa para não fazer o que não deve ficar para depois, mesmo que rediscutamos tarefas e funções logo ali adiante. Em recente evento internacional, escutei apresentação de Eric Edwin Howell, Division Director, Collaborative Inpatient Medicine Service (CIMS) at Johns Hopkins Bayview Medical Center, onde disse que, no seu hospital, há um grupo que trabalha estratégias para troca mais segura de informações entre profissionais e equipes. Ele, segundo suas próprias palavras, trabalha para que este grupo seja o menos necessário possível. Percebam como são questões complementares, embora exista hierarquia de importância.
Em palestra anterior a minha houve quem apresentou a seguinte ideia: “O corpo clínico pode ser composto por médicos contratados OU é aberto”, dando a entender no seguimento imediato que avaliação de desempenho é para médicos contratados apenas - o mesmo grupo do qual seria indicado exigir, segundo ele, imediata e não negociável adesão a normas e rotinas. Fiquei com a certeza, neste momento e em algumas outras oportunidades distribuídas por todo o evento, que muitos gestores, convictos de que não podem prescindir do seu corpo clínico aberto, o trata como “mal necessário”. O termo mais usado para criticar o grupamento foi “distante”. Não é de se surpreender que reclamem de falta de parceria, por mais que tentem agradá-los: até mesmo na vida, quando, em um casamento, alguém está ali por pura obrigação, e não por convicção, pode existir contrato e até intenção, mas não haverá sintonia e reciprocidade espontânea.

Ora, o profissional distante não é necessariamente indesejável. E, muito menos, é ou deve ser ingerenciável (a dificuldade aumenta, isso sim). Assim como (e voltando ao ponto central) acredito que, nos dias de hoje, cria-se uma dicotomia muito pouco prática ao se sugerir escolha binária (entre duas alternativas e uma, ou outra, tem de ser escolhida). A complexidade e o dinamismo da prática moderna exigem entrelaçamentos e inovações.

O sistema norte-americano (e cada vez mais o nosso) já está claramente dividido com 3 tipos de médicos categorizados de acordo com sua relação com o hospital, e não mais em corpo clínico aberto ou fechado: The Home Team (intensivistas, emergencistas e, mais recentemente, hospitalistas - entre outras inúmeras possibilidades que merecem muito cuidadosa avaliação de custo-efetividade), Important Visitors e Office-Based Physicians. O que deve determinar a escolha entre os dois primeiros? A realidade local e atual (quem és, qual teu perfil, quem são teus pacientes, onde queres chegar, o que é mais custo-efetivo para a tua organização) deve pautar a maior utilização de um ou de outro, bem como a maneira de se relacionarem. Não se trata mais de escolher um ou outro! E neste novo cenário, um médico distante não necessariamente é ruim. Mas interessa sim seu desempenho e seus resultados. Determinada organização poderia optar por usar de tele-dermatologia, por exemplo, e isto não deveria implicar que o professional atue dissociado de políticas institucionais ou procedimentos operacionais padrões, descompromissado com ações que gerem qualidade e valor, mesmo estando, e literalmente, à distância. Bem como acredito que determinados perfis de hospitais não beneficiam-se de médicos “tão próximos” nas enfermarias, digo hospitalistas. É preciso medir, autoconhecer, e então escolher, gerenciar. Há instituições que reclamam de seu corpo clínico aberto, sem saber os resultados das diversidades envolvidas. Como colocou brilhantemente César Abicalaffe em sua apresentação no mesmo evento: “se você não pode medir, você não pode gerenciar” (Drucker); “se você não pode gerenciar, você não pode melhorar” (Harrington); “melhor é a avaliação de desempenho e de seus resultados em saúde quando analisa o resultado de ações integradas - mundo real -, discriminando e diferenciando os envolvidos com transparência e assertividade”.

Cabe as organizações então, a partir de seus princípios essenciais (missão, visão e valores) e metas estratégicas, estabelecer necessidades, funções e objetivos. E padrões mínimos para todos*, sejam médicos distantes, visitantes ou próprios da casa. Promover trabalho em equipe. Qualquer coisa diferente disto é desequilibrar a balança para pura conveniência de alguns, sem foco no paciente. Tão importante quanto o cliente externo deve ser o cliente interno, que não pode ficar como o mexilhão, pressionado entre o mar e o rochedo – analogia capaz de ilustrar bem a natureza antagônica ou contraproducente da competição entre diversos stakeholders em nosso sistema de saúde.

Administrators must measure quality indicators, mortality, length of stay, readmissions, infection rates, cost per case and other metrics and set minimum standards for physicians who practice in their hospital whether they are hospitalists or not. The minimum standards should be the same for all. Perverse financial incentives will unfortunately promote care processes that are not necessarily in the best interest of the patients. David Klocke, Chair, Division HM, Mayo Clinic em troca de e-mails comigo em 10/2010.

No final de minha fala, apresentei um modelo global de assistência em enfermarias onde encaixo hospitalistas com o modelo tradicional, não em substituição, também não como “serviço de apoio” exclusivamente.

Recentemente, Gerente de Qualidade e Segurança de tradicional hospital paulista disse-me: “vontade até teríamos de ter o tipo de hospitalista que defendes, mas não podemos em razão de nosso corpo clínico”. Espero ter sido capaz de demonstrar que não proponho nenhuma Revolução.

Se é verdade que médicos têm muito a melhorar, desapegando-se de seus próprios mitos e crenças, está na hora de gestores pararem de tratar médicos visitantes como “intocáveis” e intensivistas, emergencistas e hospitalistas como “móveis e utensílios”.

Os desafios da próxima década são Trabalho em Equipe, Avaliação de Desempenho e Gestão de Pessoas.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

O Ato Médico e os médicos hospitalistas

- "Dr, o médico da paciente já disse que não consegue vir hoje, ela está bem, ele disse que não precisa mais mantê-la hospitalizada, pelo protocolo institucional és tu que deve ir lá dar a alta".  

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Evento em Curitiba será capaz de reunir quase todos os pioneiros.

http://www.hospitalistas.med.br
São representantes da diretoria ou de comitês de outra entidade que fundei e ergui. Alguns se mantiveram por um tempo depois de minha saída - tentaram mais, infiro que sem sucesso também.

Há hoje um clima de colaboração muito legal, sob a liderança do grupo de Curitiba, que convidou-me para palestrar, mas justifiquei negativa pela necessidade de abrir espaços, trazer gente antiga e nova. Será um imenso prazer ser um simples participante deste evento!

Convido todos meus contatos para o Congresso Brasileiro de Médicos Hospitalistas!

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Como idiotizar o movimento de segurança do paciente

'Identificação do paciente: a mensagem tem sido passada errada' foi a tônica de minha última postagem em Saúde Business: http://saudebusiness.com/como-idiotizar-o-movimento-de-seguranca-do-paciente/


Nunca vi em nenhum hospital que já tenha visitado nos EUA um enfermeiro checar pulseira para confirmar que o paciente na sua frente é mesmo aquele que tão bem conhece. E depois ainda ter que registrar isto.

Não sei se aqui é apenas falta de liderança ou quem sabe ocorra ainda problemas a partir das traduções. A ponto de que questiono se não temos que buscar outro nome para a meta #1. Estamos identificando o paciente que sabemos quem é, e o sangue é instalado sem garantia que seja para o paciente correto.

Não faz sentido garantir pelo menos um registro ao dia em prontuário de que o paciente foi "identificado" - para que no dia da avaliação (seja tracer ou revisão de prontuários) não deixe de constar que foi "identificado o paciente". E costuma servir 🙊! Mas a importância da identificação é dinâmica.

domingo, 5 de junho de 2016

Um convite seguido de reversão demonstra reconhecimento técnico seguido de influência da política na grade dos eventos

Recentemente recebi:

Prezado Guilherme Brauner Barcellos

A WONCA promove a 21ª Conferência Mundial WONCA de Médicos de Família, que será realizada de 2 a 6 de novembro de 2016, no Riocentro, Rio de Janeiro/RJ – Brasil.

A Comissão Científica têm a honra de convidá-lo a participar da programação do evento, conforme proposta de atividade:

Paralel Session
Panel: Continuity of care between PHC  and hospitals:  safe and effective strategies for transition of care
 
Speakers: Mark Williams (USA), Sati Jaber Mahmud (Brazil) and Guilherme Brauner Barcellos (Brazil)

Quinze dias depois fui desconvidado. 

Comissão Científica justificou que o fez inicialmente por reconhecimento técnico, mas que precisou ceder a pressões políticas - exigência de alguém que tem uma mãe psiquiatra que é influente junto aos médicos de família e importante para o movimento MFC. 

Fiquei duplamente contente. Pelo reconhecimento. E porque ando, há um bom tempo, avesso à política em geral - quando está em jogo, não faço questão. Inclusive repassei outra participação no mesmo evento. 

terça-feira, 24 de maio de 2016

Academia Brasileira de Medicina Hospitalar

Neste último final de semana, foi fundada a ABMH.

Passo, muito feliz, a ter estes representantes:


E por eles trabalharei...

quinta-feira, 31 de março de 2016

quarta-feira, 30 de março de 2016

Rotina de um médico hospitalista não segue roteiro único

Entrevista para jornalista do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente gerou a seguinte matéria:

Entrevista para o IBSP

Acrescento abaixo outros tópicos conversados:

- Como os gestores enxergam a MH no Brasil?

Lembrei que há de tudo. Que muitos já compreendem a proposta, e percebem a importância de colocar paciente no centro + hospitalistas como coordenadores do cuidado - regulando a relação entre paciente e diversos outros entes da complexa assistência hospitalar.

Que outros gestores ainda não. E que costumam ser os mesmos que ainda não colocam o paciente no centro do cuidado, e sim subespecialidades médicas ditas lucrativas - culminando em médicos no centro de tudo, como clientes principais e soberanos do hospital.

- Como adaptar o modelo norte-americano para o Brasil?

Precisa adaptar????

Se vejo muito mal uso do modelo aqui, com inserção de hospitalistas em tarefas com baixo grau de autonomia ou eminentemente burocráticas, isto ocorreu e segue acontecendo nos EUA e em outros países. Por outro lado, temos bons exemplo de programas no Brasil fazendo exatamente o que fazem hospitalistas que se destacam nos EUA.

- Quais os maiores desafios de um médico hospitalista no Brasil?

São dois os principais, na minha opinião:

# Habilidades e competências para atuação não clínica: ao menos noções básicas de melhoria da qualidade e segurança do paciente;

# Remuneração, para garantir o tipo de vínculo e envolvimento pretendido.

segunda-feira, 21 de março de 2016

Hospitalistas no HDP


SHM2016

 Assiste vídeo

Interessantíssimo os relatos do grande pioneiro Wacher com dois outros que o ajudaram na fundação da sociedade (foto acima, vídeo clicando). Uma história de colaboração, de absoluta entrega do que criaram - SHM - para os próprios membros. Hoje nenhum deles ocupa mais cargos diretivos na entidade, por exemplo. São prestigiados - por reconhecimento.

Lembrando do período inicial do movimento que deflagrei no Brasil, impossível não vir à mente a imagem de um colaborador que insistia na ideia de "apressar as coisas no sentido de fazer a sociedade dar dinheiro". Fosse para o propósito associativista e colaborativo, tudo bem. E eu achava que bastaria lembrar o propósito e o estatuto do que criei com muito pouca ajuda inicial e, principalmente, lembrar que nada impedia o desenvolvimento de iniciativas paralelas e lucrativas...

Época em vários aspectos chata, de muito gasto de energia pessoal, de repetição cansativa deste tipo de lembrança, de validade até questionável pela recorrente aproximação de gente interesseira demais. Validade que comprovou-se verdadeira pelo encontro de tantas outras pessoas legais. Pena que este perfil muito pouco quis protagonismo, o que, sendo mais do que simples coincidência, e acho que é, pode representar relevante lição de vida.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Lançado site do evento!


Projeto na prática organizado pelo IBSP e Lucas Santos Zambon, em que pude contribuir com os palestrantes internacionais, em parte como agradecimento ao período em que Lucas contribuiu em iniciativa minha de promoção do hospitalista, sem jamais competir, com espírito colaborativo e até altruísta. Participa hoje de organização transparente, com objetivos claros e relevantes. Convido todos meus contatos hospitalistas e simpatizantes.
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